Esta postagem refere-se
ao episódio “A Coroa do Imperador”, da minissérie “Cidade dos Homens”, exibida
em 2002, pela Rede Globo, que tem como personagens principais Acerola e
Laranjinha, que são alunos de uma escola pública e uma professora de História,
cujo nome é desconhecido. O episódio narra a realidade escolar dos meninos e
traça paralelos entre o cotidiano da violência na favela onde eles moram e o
conteúdo ministrado pela professora - a Independência do Brasil.
Durante a aula,
enquanto a professora descarrega mecanicamente um desfile de acontecimentos,
por meio de slide, os alunos tentam interrompê-la para manifestar suas dúvidas.
Indiferente aos anseios dos alunos, a professora posiciona-se como agente do
processo de ensino e limita os
discentes à condição de ouvintes, deixando claro que a mesma representa a
escola na visão tradicional, ou seja, ela detém o poder quanto à metodologia,
conteúdo, avaliação e forma de interação. Continua sua espécie de auto aula, um monólogo e sem preocupar-se
com a compreensão dos alunos, sendo seu único interesse é a conclusão do
conteúdo, ela insiste em perguntar: “posso dar aula”? Não é o processo de
ensino-aprendizagem, é só parte dele: o ensino.
Um aspecto chama a
atenção: o recurso tecnológico (projetor de slides) é utilizado de forma
acessória, ilustra a fala da professora, não possibilita interação e nem
construção do conhecimento por parte do aluno, nos prova que tecnologia sem
inovação metodológica não acrescenta nada, é inútil.
Após as explicações,
a professora informa que haverá uma excursão da turma para Petrópolis, cujo
objetivo será conhecer a coroa do imperador e impõe algumas condições aos
alunos, tais como: o pagamento pelo custo do passeio e que o conteúdo deverá
ser resumido oralmente, para que eles demonstrem o que assimilaram do assunto
tratado na auto aula. A partir desse
momento, percebe-se que o interesse dos alunos é mais pelo passeio enquanto
momento de lazer do que, propriamente, pelo conteúdo que está sendo trabalhado.
A preocupação em conseguir o dinheiro para o passeio é outro problema
evidenciado no filme, através dos personagens Acerola e Laranjinha.
O ponto
mais relevante do filme é seu final, o retorno ao ambiente da sala de aula;
onde os alunos são submetidos a uma espécie de “prova oral” e, como nenhum
deles obtêm bom aproveitamento, a professora resolve cancelar a excursão,
justificando que não houvera interesse deles pelo conteúdo trabalhado (a professora responsabiliza os alunos pelo
fracasso escolar); é nesse momento que Acerola propõe à professora explicar
todo o conteúdo ministrado por ela com a condição que, se ele obtiver êxito,
ela deixará que todos participem do passeio. Acerola explica a independência do Brasil e a
invasão do território português, comandada por Napoleão Bonaparte, através de
outra história, ou seja, sua própria experiência adquirida nos morros onde mora
e então faz uma analogia aos dois mundos, a favela e o asfalto. Os soldados de
Napoleão são comparados com os traficantes, cuja hierarquia também é militar, o
chefe é o general, que apresenta os seus soldados.
Surge a associação de fatos ocorridos na vida real com a história
exposta em sala de aula. Aos poucos, Acerola, utilizando associações
de estratégias de conquistas empreendidas por Napoleão com as dos traficantes
do morro, consegue passar para turma tudo o que entendeu, obtendo um bom
desempenho e atraindo a atenção dos demais alunos da classe, o que deixa a
professora surpresa e reflexiva no que diz respeito a sua prática pedagógica,
sendo que a mesma retoma as explicações concluindo as associações anteriormente
iniciadas.
No dizer de Aristeu Portela:
Um traço que percorre todo o
enredo desse episódio sintetiza, a meu ver, seu objetivo: o desejo de relatar,
contar, representar uma outra história do
Brasil. O que fica claro, na reação dos alunos a uma professora que descarrega
quase automaticamente sobre eles um desfile de fatos e personalidades
históricas (no caso específico, a fuga da corte portuguesa para o Brasil em
1808), é a distância construída entre a noção de brasilidade que aprendemos a
considerar certa e oficial, e a vida cotidiana de boa parte dos brasileiros –
ou, como poderia talvez dizer Guy Debord, da distância entre a História (com
“h” maiúsculo) e a vida realmente vivida dos homens.
Clic nos links e assista o filme, depois deixe seus comentários:
Marcelo Carvalho
2 comentários:
É Marcelo, entendi que a versão de Estado que ficou foi a concepção do aluno, portando ele não precisa da escola para entender o pacto social, é isso?
Insisto sempre que é necessário dar significado ao conhecimento prévio dos alunos envolvendo-os com o conhecimento sistematizados das área. A outra parte da aula seriam atividades que viabilizassem a relação de conhecimentos sistematizados com realidade vivenciada pelos alunos. Mas isso não interessa ao produto mercadológico (filme) que faz apologia à barbárie quando evidencia o poder paralelo do tráfico em lugar do Estado.
É papel da escola ensinar sim!
Roberto Martins
Roberto,
Começarei pelas convergências, elas nos unem.
De fato a obrigação primeira da escola é ensinar aos alunos o conhecimento sistematizado nas diversas áreas do conhecimento, e ensinar bem!
Focalizei meu texto mas no aspecto da aula e da metodologia da professora.
Outros itens caberiam e podem iniciar novas discussões, como o que apontas, o conceito de estado e a visão maniqueísta da velha mídia e sua insistência em evidenciar a violência urbana.
Acho que no final de uma das postagens solicito a intervenção dos leitores, aqui vejo que aceitastes o convite, obrigado.
Mas faço outra instigação: escreva mais sobre sua interpretação do filme, sobre o fato histórico narrado e principalmente sobre o que dizes:
"Insisto sempre que é necessário dar significado ao conhecimento prévio dos alunos envolvendo-os com o conhecimento sistematizado das área. A outra parte da aula seriam atividades que viabilizassem a relação de conhecimentos sistematizados com realidade vivenciada pelos alunos".
Gostei muito, queria que você falasse mais sobre o assunto, se desejar o espaço está aberto, envie o texto que posto aqui no blog.
Um abraço fraternal,
Marcelo Carvalho
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