Na semana passada, a sociedade
paraense ficou chocada ao ver que a Santa Casa de Misericórdia, a maior maternidade
pública do estado, decidiu fechar as portas para novas grávidas alegando
superlotação.
O resultado trágico todos conhecem,
por isso não julgo necessário entrar em detalhes; fixo somente no argumento para a recusa de
atendimento: a superlotação.
Sou professor da rede pública de
ensino - SEDUC e SEMEC (Belém) - desde o ano de 1998 e, nestes tantos anos, a
tônica sempre foi o trabalho em turmas superlotadas. Lembro que em um dos anos,
para registrar as atividades e avaliações de cada turma, era necessário ter
dois diários de classe, pois cada diário só comportava informação de 50 alunos.
Nossas turmas tinham 55 e algumas até 60 alunos.
Mas a diretora não determinou o
fechamento da escola e nem deu ordem para proibir a entrada dos alunos; cada
professor teve que encontrar uma forma de trabalhar e atender os alunos; as
atividades passaram a ser feitas em equipe e algumas avaliações em dupla. Dessa
maneira, fomos exercitando a criatividade todos os dias, até o fim do ano
letivo.
Se me perguntarem: faltou
qualidade de ensino? Sim, esta foi ferida de morte! Os professores estavam
satisfeito? Não; para muitos o prazer em exercer a profissão foi extinto,
sufocado em extensas jornadas de trabalho, falta de estrutura, etc. E as
perguntas poderiam ser várias, mas um fato é irrefutável: a escola não fechou
as portas, nenhum aluno foi impedido de estudar pela superlotação. E se péssimas
condições de trabalho e baixos salários fossem justificativas para suspensão do
atendimento, aí então, todas as escolas fatalmente fechariam suas portas.
Não, caro leitor, este não é um
texto conformista ou reacionário, ou ainda que negue a realidade, apenas quero
evidenciar que vários setores do serviço público enfrentam dificuldades para
exercer suas atividades profissionais. Não são apenas as maternidades ou postos
de saúde!
Se o argumento da superlotação
for aceito para justificar falta de atendimento, ficaremos assim:
A polícia não prenderá mais
ninguém: as delegacias e as casas penais estão lotadas;
Juízes e promotores com muitos processos, não receberão novas demandas;
Os professores não aceitarão mais ministrar suas aulas: as turmas estão com mais de 35 alunos;
O motorista de ônibus deixará
de parar nos pontos, depois que não houver mais assentos livres para os
passageiros: ônibus lotado nunca mais!
Conclusão:
Não será negando o atendimento à
parcela mais pobre da sociedade que resolveremos nossas questões, que veremos
nossas reivindicações atendidas.
Lutar é preciso, mas não podemos
errar o alvo, o adversário não é a mãe que bate à porta da maternidade.
2 comentários:
parabéns pelas argumentações. Complementando diria o seguinte, não é pela falta de capacitação, que deixaremos de matricular alunos especiais. O professor que não conhece LIBRAS, pode até ter como interlocutor outro aluno da classe, que se comunique com pessoas com deficiência auditiva. Dessa forma, no dia-a-dia, apesar das dificuldades vamos conseguindo pequenas conquistas.
Emanuel você está com toda razão, sua observação sobre a educação inclusiva reforça a ideia central do texto.
Obrigado!
Marcelo Carvalho
Postar um comentário