quinta-feira, 31 de maio de 2012

Catadores, os homens certos no lugar errado


A primeira semana, do mês de junho, é dedicada às discussões sobre temas ambientais. Em nosso calendário, é no dia 5 deste mês, que é comemorado o dia do meio ambiente. 

O blog já entrou no clima e antecipou as discussões, focando em um tema específico: os resíduos sólidos e o trabalho dos catadores.

Para aprofundar o debate, publico um artigo escrito por Jorge Pinheiro*, em outubro de 2007. 

                                                                   Imagem: Google
Boa leitura:

 Encerramento dos lixões: Catadores, os homens certos no lugar errado. 

 O debate é importante, o lixo deixou de ser a muito tempo um problema só para engenheiros e sanitaristas. O aspecto social aparece com força e só visitar aterros sanitários premiados não me parece suficiente para entender nossa realidade. Pensar o lixo é uma tarefa multidisciplinar, como qualquer problema hoje.  

A questão do meio ambiente deu visibilidade e importância a uma atividade mais que centenária: a catação de materiais reutilizáveis/recicláveis. 

As empresas "descobriram" que externalidades negativas, acabavam materializadas nos lixões, e que esses "não lugares" eram espaços produtivos ocupados por catadores de materiais recicláveis, verdadeiras "ecobarreiras humanas" do desperdício energético. A emergência do catador como agente econômico e ambiental se impõe ao processo de estigmatização social. 

Na discussão sobre a melhor maneira de tratar o problema dos lixões, quando do seu encerramento, algumas pessoas acham que o tratamento deve ser visto apenas pelo angulo técnico/sanitário/financeiro, realizado por empresas especializadas usando a tecnologia dos países civilizados, isto é, o mercado resolveria. E que os catadores, deveriam procurar mais o que fazer. 

O Aterro sanitário de Nova Iguaçu (RJ), exemplo de aterro bem sucedido, é um empreendimento modelo que alcançou visibilidade e notoriedade. Nas apresentações em power point, sobre o empreendimento, o catador aparecia, mas fazia parte apenas do problema, de tão invisível que era teve que ser circundado por um círculo amarelo, para diferenciar o catador do lixo. Não tinha texto, o catador, sem significação, circundado de amarelo como um sinal de alerta, sugestivo.  

No entanto, existe uma outra maneira de encarar o problema, é enfrentar a questão social com justiça. Qual é a responsabilidade da sociedade?  

Defendemos que haja uma responsabilização da sociedade para reduzir o lixo gerado. Mas que também deve se respeitar a atividade que os catadores exercem, mesmo que informalmente, pois essa atividade beneficiou a sociedade esses anos todos. A sociedade tem uma dívida com o trabalho que vem sendo realizado pelos catadores. Só no Aterro de Jardim Gramacho (RJ), funcionando a mais de 30 anos, cerca de 3.000 catadores, retiram algo como 200 ton/dia de materiais recicláveis. Para se ter uma ideia de comparação uma cooperativa média de catadores organizados opera cerca de 30 ton/mês.

É preciso garantir que durante o processo de encerramento dos lixões a sociedade reconheça o direito do catador escolher se deseja continuar a trabalhar na cadeia da reciclagem, sendo membro de uma cooperativa autogestionária, dentro de um programa de coleta seletiva solidária, ou tentar a sorte em outra atividade produtiva.  

Mas para se chegar aí, são necessárias políticas públicas responsáveis que de fato levem em conta o protagonismo do catador no processo. Quando nos deixamos levar pelo "senso comum", que estigmatiza o catador, fica fácil concordar com medidas higienistas. O catador conhece os materiais, sua classificação, o valor de cada um, pode ser também um educador socioambiental no processo de implantação da coleta seletiva na cidade. 

Não estamos discutindo a melhor tecnologia de destinação final dos rejeitos - pois a escolha deve ser feita de forma participativa pela sociedade, após a construção de um Plano de Gestão Integrado para os RSU - e sim a metodologia empregada para a "inclusão social" dos catadores pós-encerramento dos lixões. A questão é saber se os catadores vão ser tratados como sujeitos ou como objetos.  

A ideia que defendemos é da efetiva participação do catador, como sujeito, no processo de encerramento dos lixões (...).  

Só a coleta seletiva solidária pode:

• Colocar o homem certo: O catador

• No lugar certo: A cooperativa autogestionária

• Executando o procedimento correto: Manuseando materiais recicláveis limpos, separados na fonte. 

Isto é viável e pode acelerar o processo de institucionalização de uma governança democrática na área de gestão dos RSU. 

*Jorge Pinheiro – Sociólogo, Mestrando em Sociologia e Direito pela UFF 

Fonte: © www.lixo.com.br

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