sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Belém: uma cidade doente



Belém é uma cidade doente e seu estado é grave; diria quase terminal. A cidade parece disputar uma corrida e o pódio de chegada é o caos ou a barbárie.

Quais os sintomas que indicam a patologia de Belém? São vários; talvez aqui nesta pequena postagem não caibam todos, mas citarei alguns que considero os mais graves:

  • Poluição Sonora – Parece que ouvir música deixou de ser um prazer, tornou-se sessão de tortura. Bares, carros de som, automóveis particulares, templos religiosos, camelôs, serviços de publicidade (instalados em postes), bicicletas com sons potentes e, claro, não dá para esquecer as famosas aparelhagens. Todos unidos com o único propósito: incomodar a vida alheia; condenar o cidadão a um cotidiano de barulho, sem descanso dentro e fora de seu lar. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o limite tolerável ao ouvido humano é de 65 decibéis; acima disso nosso organismo sofre de estresse. Portanto, sofremos diariamente com o excesso de barulho.

  • Lixo – Belém transformou-se num verdadeiro lixão a céu aberto. É difícil encontrar uma rua, avenida ou praça em que não haja um depósito irregular de lixo. O que impressiona é a quantidade e variedade do material depositado pela população e, pasme, até pela própria prefeitura ou empresas contratadas por esta. Nas ruas e praças encontramos sofás, fogões, geladeiras, restos de podas de árvores, sucatas de carros, restos de materiais de construção, lixo orgânico, garrafas pet, sacos plásticos, etc.
Além dos impactos ambientais, paisagísticos e na saúde da população esses materiais, se fossem recolhidos adequadamente, poderiam gerar riquezas, pois podem ser reciclados e reaproveitados; sendo assim reinseridos no ciclo econômico.
O professor Márcio Magera, da Unicamp, desenvolveu um software que calcula a quantidade de lixo produzido e também quanto pode ser reciclado e qual o ganho econômico com tal atividade; portanto, é possível saber qual o valor do lixo que está nas ruas, praças e mesmo no lixão do Aurá.
Como sabemos, Belém não é uma cidade rica e aqui é notório a falta de indústrias e de oportunidade de emprego; portanto, o lixo poderia gerar excelentes oportunidades de emprego e renda. A reciclagem é comprovadamente um bom negócio, porém, Belém, por ser uma cidade doente, prefere desperdiçar tal empreendimento e depositar seus resíduos em qualquer esquina e, neste aspecto, somos uma cidade democrática, pois o lixo está na Praça da República (centro e cartão postal da cidade) e também nas periferias.

  • Trânsito – Belém tem um dos trânsitos mais violentos do Brasil. O transporte coletivo não funciona bem e não é uma alternativa segura; é caro, sujo e ineficiente. O resultado é que, quem pode, opta por usar o transporte particular: carros, motos e mesmo a bicicleta. Esta última, se fosse utilizada por questões de consciência ecológica ou por opção por um meio de transporte saudável, seria uma iniciativa louvável; porém, o uso da bicicleta como meio de locomoção não atende a estes princípios; é bem provável que os ciclistas tenham desistido dos ônibus em razão do preço da passagem e da péssima qualidade do serviço.
O resultado da falta de uma política de valorização dos transportes coletivos eficientes e modernos (na verdade, em Belém, todos sabem que só existe o ônibus) é que as ruas da cidade estão abarrotadas de carros, motos, ônibus e as famigeradas vãs e micro-ônibus, aqui chamados de “alternativos”. É um tormento ter que passar todos os dias pelo Entrocamento, por São Brás ou pelo Centro Comercial. Falta educação, fiscalização, sinalização, senso de coletividade e punição aos infratores de trânsito, em uma palavra, falta civilidade.

  • Calçadas de Belém – Já vai longe o tempo em que as famílias guardavam o hábito de pôr cadeiras nas calçadas ao entardecer para um bom bate-papo. Hoje, as calçadas servem de estacionamento de carros, motos e até caminhões. Estes, por sua vez, concorrem com bares, lojas e camelôs. Além da utilização irregular das calçadas, elas não seguem nenhum tipo de padronização ou planejamento; cada proprietário de imóvel a constrói segundo seus próprios interesses e sensibilidade estética. “Acessibilidade” é palavra que não cabe no repertório de Belém; as pessoas se acostumaram a caminhar nas margens das ruas e avenidas.

  • O comércio informal ou os ambulantes – Tecnicamente o comércio ambulante é aquele praticado por indivíduos que circulam pela cidade oferecendo produtos e serviços. Bem, isto pode ser correto em qualquer cidade do mundo, menos em Belém, a cidade doente. Aqui, ambulante não anda, monta banca, com direito a “gato” (expressão para furto de energia) e de preferência sobre uma calçada ou via pública. São centenas ou milhares de barracas que desvalorizam a paisagem urbana da cidade e aqui também o problema é democrático, as barracas ocupam o centro e a periferia da cidade.

  • Violência urbana – Alguns até poderão argumentar que a violência não é um privilégio de nossa capital, vide o caso do Rio de Janeiro; porém, em Belém, o que chama a atenção é a banalização da violência, os assaltos frequentes, os homicídios e, principalmente, os casos em que os delinquentes fazem as vítimas de reféns, espécies de escudos humanos. Casos de assaltos seguidos de perseguição policial em que o desfecho é uma longa negociação entre bandidos e policiais e, no meio do fogo cruzado, um cidadão inocente tomado como refém tornaram-se rotineiros, tanto que a população já decorou o roteiro. Todos sabem que, no final, o bandido se entregará e o refém será libertado; a variante é só o tipo de exigência que será feito: presença da imprensa, da família do meliante, água-de-coco, cigarro ou outra extravagância.

Ainda poderia discorrer sobre a falta de saneamento básico, de boas escolas públicas, da falta de moradia que geram por sua vez as ocupações irregulares, conhecidas como invasões, da falta de saúde pública de qualidade, da poluição visual da cidade com sua irracional quantidade de outdoor e faixas... Se fosse escrever sobre todas as nossas mazelas, isto não seria um texto para meu blog, seria uma tese de doutorado.

Porém, tem algo que é preciso pensar: Se moramos em uma cidade doente, onde os moradores buscam seu bálsamo? Seu anestésico antirrealista?

A resposta não é simples, mas a cidade nos dá algumas dicas. É fácil encontrar na cidade, em quase toda esquina, os bálsamos dos cidadãos de Belém, aquilo que lhes amortece a alma, que lhes fornece a fuga momentânea para seus dramas existenciais ou não.

Em Belém, encontramos em cada esquina (aqui confesso certo exagero) um bar, uma farmácia e um templo religioso. Não é raro encontrá-los lotados. Portanto, é possível deduzir que nossos cidadãos buscam suas soluções individuais entorpecendo-se no bar ou na farmácia ou apelando a intervenções divinas, pois ao que parece eles abdicaram da política como forma de mediar conflitos e mudar a realidade.

Talvez, não seja por acaso que não tenhamos bancas de revistas, livrarias ou bibliotecas na proporção em que temos farmácias, bares e igrejas.

Alguém sabe dizer quantas livrarias existem em Belém?

Marcelo Carvalho


Assista alguns vídeos sobre Belém:






2 comentários:

Tony Cunha disse...

Muito oportunas suas considerações sobre Belém, Marcelo. Levando-se em consideração que Belém, com uma população de 1.437.600 habitantes, é a 10ª cidade mais populosa do Brasil e a 2ª da região Norte. A cidade possui o maior IDH entre as cidades do norte e, nos últimos anos, vem se verticalizando de forma acelerada, pelo fato de não haver mais áreas horizontais.
Temos o 5º metro quadrado mais caro do País (fonte IBGE). Se seguirmos esse ritmo sem a devida solução para os problemas que vc elencou muito em breve esteremos vivendo o mesmo caos urbano atribuido a São Paulo e outras grandes cidades.

Marcelo Carvalho disse...

É meu caro Tony,

Nossa cidade poderá ficar inviável, feliz são os moradores de Bragança, além de ser uma cidade linda e tranquila é a cidade do Rádio Escola.

Se Belém não melhorar, acho que vou morar em Bragança!

Um abraço,

Marcelo Carvalho